quinta-feira, 12 de julho de 2012

THE MOST TERRIBLE NIGHTMARE... THE MOST HORRIBLE DREAM




Horror. Desde os primeiros vestígios do gênero no cinema, não foram poucos os artistas que se empenharam para promover a edificação do mal-estar nas salas de projeção. Dentre realizadores e atores, muitos se alçaram ao status de ícones do cinema de horror, mas poucos se tornaram verdadeiras lendas, perpetuadas não somente pela memória do cinema, mas também como a imagem/produto da indústria da cultura.

Ao lançar a proposta “cinema de horror” ou “filmes de terror”, é fato que, para a maioria das pessoas, haja associações com imagens tenebrosas, perseguições e gritos intermináveis. Para o grande público, talvez seja mais recorrente relacionar o gênero às figuras caricatas como o Brinquedo Assassino e Fred Krueger, ou se levar por influências contemporâneas, como os sanguinolentos filmes de massacre (as franquias “Premonição” e “Jogos Mortais”), que se disfarçam como cinema de horror, enquanto são apenas mortes em série sem argumentos convincentes.

No cinema, o caráter de clássico não se limita apenas aos filmes antigos. Produções contemporâneas também têm o potencial de atingir esse prestígio. Como dito por inúmeros críticos, “um clássico imediato”. Portanto, até mesmo na leva dos últimos filmes da década de 2000, podemos encontrar amostras do horror genuíno, cunho que, por mais de um século, elevou determinadas representações fílmicas do terror à qualidade de clássicos indispensáveis.

Dentre as produções que cumprem o horror com brilhantismo, selecionei os títulos e informações sobre as tramas. Agora, caberá a você se imergir nesse universo de ansiedade e inquietação, descobrindo ou rememorando as tragédias de horror mais cultuadas no cinema.

LE SPECTRE ROUGE (1907), de Segundo de Chomón


Neste pequeno filme dos primórdios do cinema, o Mago Demoníaco realiza performances macabras numa gruta. Ele usa mulheres para a demonstração de sua magia, dialogando diretamente com o espectador (algo muito comum nessa primeira fase do cinema). O que para nós é um espetáculo, mistura de medo e comédia circense, para as mulheres na trama é uma verdadeira tortura. Porém, um Bom Espírito surge para reivindicar a liberdade das vítimas e extinguir as atrocidades do feiticeiro. Curioso interpretar a derrota do Mago pelo Espírito, representado por uma atriz, como uma crítica ao machismo e ao sistema patriarcal.

NOSFERATU (1922), de F.W. Murnau


Baseado no romance gótico de Bram Stoker, “Drácula”, este clássico expressionista acompanha a obsessão de Conde Orlok por uma nova e importante hóspede em seu castelo. O vampiro interpretado por Max Schreck é pioneiro das representações do Conde Drácula e do próprio culto ao vampirismo no cinema.

METRÓPOLIS (1927), de Fritz Lang


Trama futurista que serviu de base para inúmeras obras da ficção científica, leva o horror ao patamar psicológico. Baseando-se na verídica desigualdade social na qual se encontrava o estado alemão, o filme expõe um futuro onde os ricos vivem próximos ao paraíso, no topo dos edifícios, enquanto os pobres e operários vivem no subsolo, escravizados pela ambição dos poderosos. A produção também insere no cinema um medo genuíno do futuro, ao confrontar a eficiência limitada dos homens com a eficiência inesgotável das máquinas, lançando a questão sobre uma possível substituição da mão-de-obra humana pela mecânica, acarretando na extinção da classe trabalhadora por sua inutilidade.

FREAKS (1932), de Tod Browning


Com um elenco de deficientes físicos e mentais verdadeiros, a narrativa acompanha o cotidiano de uma trupe circense. Ao descobrir que o anão Hans possui uma grande fortuna, a bela e preconceituosa Cleopatra decide se casar com ele. Tudo não passa de uma armação, exposta pelos descuidados e a repulsa de Cleo pela “família” de monstros do circo. A vingança dos freaks contra a golpista está entre as cenas mais funestas do cinema.

PSICOSE (1960), de Alfred Hitchcock


Marion Crane sendo esfaqueada no chuveiro está na memória de quem, inclusive, não viu o filme. A cena ilustre foi filmada em 70 ângulos diferentes, por 7 dias. A trilha sonora é a mais recorrente nas representações de pavor ou suspense, sendo inclusive vulgarizada, como nos populares programas de TV aos domingos. O filme contribuiu para firmar ainda mais a alcunha de Hitchcock como Mestre do Suspense. Interessante como a trama evolui de suspense policial para terror psicanalítico, imortalizado numa das frases mais celebradas do cinema, “A boy’s best friend is his mother”. As filmagens de “Psicose” serão retratadas em “Hitchcock and the making of Psycho”, estrelado por Anthony Hopkins e estreia prevista para 2013.

O QUE TERÁ ACONTECIDO A BABY JANE? (1962), de Robert Aldrich


Duas lendas da Hollywood clássica se encontram nessa produção surpreendente. Bette Davis e Joan Crawford interpretam, respectivamente, as irmãs Baby Jane e Blanche Hudson. Quando crianças, Jane era a estrela da família, cantando em teatros, enquanto a irmã era constantemente reprimida. Quando moças, Blanche ingressa numa carreira monumental como atriz de cinema. O sucesso mirim de Jane, todavia, é minguado até desaparecer. Apesar das desavenças entre elas, o destino une uma Jane desequilibrada, entregue ao alcoolismo, a uma Blanche novamente fragilizada, paraplégica após um acidente. Já próximas dos 60 anos, Blanche decide internar a irmã em uma clínica de repouso. A notícia transtorna Jane e a impulsiona a transformar a vida de Blanche em um verdadeiro pesadelo. Além da trama inteligente, é interessante o modo como Bette e Joan são representadas na juventude, com a utilização de trechos de filmes estrelados pelas próprias na década de 1930. As magníficas performances se salientam pelo fato de que as protagonistas não se simpatizavam na vida real. Rumores apontam que as agressões entre elas, no filme, não eram encenações e sim tapas, chutes, arranhões e puxões de cabelos reais.

O BEBÊ DE ROSEMARY (1968), de Roman Polanski


Ao se mudar com o marido para um novo apartamento, Rosemary Woodhouse começa a se incomodar com a extrema dedicação e os secretismos dos vizinhos, suspeitando ser vítima de alguma conspiração. Após tomar conhecimento sobre o passado macabro do prédio onde mora e das seitas satânicas conduzidas por inquilinos de outrora, Rosemary, agora grávida, suspeita que os vizinhos são bruxos e pretendem raptar seu bebê após o nascimento para ofertá-lo ao demônio. As incertezas e hesitações de Rosemary, acentuadas pelo estímulo claustrofóbico do apartamento, são pontos altos do filme, levando o espectador às mesmas dúvidas sobre o que pode ou não ser a realidade.

O EXORCISTA (1973), de William Friedkin


Garota possuída por um demônio é o pano de fundo para um argumento que explora, sobretudo, a culpa. A maldade aqui representada surge num ambiente de negligência materna. A possessão de Regan, filha de uma atriz bem sucedida, atrai personagens que carregam igualmente, por razões pessoais distintas, personalidades conflituosas, afetadas pelo egoísmo, a covardia e o menosprezo pelas relações familiares. Tecnicamente impecável ao retratar as facetas da jovem possuída, o filme ganha, sobretudo, por uma crítica e reflexão sobre a família e a posição da fé na efêmera sociedade americana da década de 1970.

O ILUMINADO (1980), de Stanley Kubrick


Família confinada em hotel vê-se às margens da tragédia, quando o patriarca é atingido pelas perturbações do isolamento em plena crise criativa. O diretor nos oferece uma história de fantasmas sem apelos grotescos. Belamente iluminado, o filme é plasticamente impecável. Os principais momentos de tensão e horror provêm dos ruídos em cena e da trilha sonora, mas, sobretudo, das interpretações, expressões célebres do trio de atores que compõem a família Torrance. É um filme de rostos. O momento em que o pai e escritor atormentado, interpretado por Jack Nicholson, arromba a porta do banheiro com um machado enquanto a mulher grita em desespero, interpretação veemente de Shelley Duvall, além de ápice da projeção, tornou-se a marca do filme, clássico do cinema, perpetuada até hoje das mais diversas formas, como em camisetas e ímãs de geladeira.

O SILÊNCIO DOS INOCENTES (1991), de Jonathan Demme


Fábula do horror, acompanha as peripécias de Clarice Starling, uma agente do FBI apadrinhada por Hannibal Lecter, um canibal encarcerado que a ajuda compreender e caçar um serial killer. Performance lendária de Anthony Hopkins na pele do maníaco Hannibal. A contratação do ator deveu-se a sua interpretação como Dr. Treves em “O Homem Elefante”. Ao questionar o contrato, afirmando que Treves era uma personagem do bem, o diretor Jonathan Demme respondeu, “Hannibal Lecter também é um homem bom, porém preso numa mente insana”.

OS OUTROS (2001), de Alejandro Amenábar


Numa mansão cercada pela névoa, Grace, a proprietária, admite novos empregados em meio às dificuldades em criar os filhos sensíveis à luz, enquanto mantém, de forma homérica, a esperança de que o marido retorne da guerra. Um tempo após a acomodação da nova criadagem, ela desconfia que a casa esteja sendo assombrada e que os próprios empregados se tratam de fantasmas. O visual e postura de Nicole Kidman foram tentativas de recriar a aura de Grace Kelly, atriz clássica da década de 1950, nas telas. Um filme atraente pela reviravolta na narrativa.

ANTICRISTO (2009), de Lars von Trier


Garoto com menos de 2 anos se joga pela janela de um prédio. A mãe em luto, dominada pela ansiedade, começa a ser tratada pelo próprio marido. Numa tentativa de encerrar o tratamento, promovendo a cura da mulher pelo confronto direto com o medo, o marido a leva a uma cabana na floresta. A narrativa, então, evolui de drama da perda para um tratado psico-antropológico sobre as relações entre o feminino, a natureza, a intervenção masculina e a maldade. Destaque para os recursos dramáticos da câmera lentíssima de Von Trier e a interpretação atroz de Charlotte Gainsbourg. A maior expressão do horror no cinema da última década.

A PELE QUE HABITO (2011), de Pedro Almodóvar


Renomado cirurgião plástico desenvolve pele artificial em cobaia humana. O cinema do desejo de Almodóvar encontra no horror um perfeito aliado para narrar a história do envolvimento entre cientista e cobaia, criador e criatura. Com ecos de “Frankenstein” e “Os Olhos Sem Rosto” (outros clássicos do horror), o filme atormenta com estética minimalista e reflexões existenciais profundas. Marcou o retorno de Antonio Banderas ao universo almodovariano, além de reascender a discussão sobre erotismo e sexualidade na filmografia do diretor.

sábado, 7 de julho de 2012

DON’T EVER TAKE SIDES AGAINST THE FAMILY… EVER


Famílias... Tão diferentes à primeira vista, mas infinitamente iguais no íntimo. Salvo por alguns membros dissidentes, uma família se define pela cumplicidade. “Almoça junto todo dia, nunca perde essa mania”. Minha última dobradinha no cinema está imersa nos valores dessa instituição. Duas histórias completamente opostas tratando, cada qual a seu modo, das farinhas de mesmo saco. “Família... Cachorro, gato, galinha”.

DEUS DA CARNIFICINA (2011), de Roman Polanski


Meu primeiro pensamento ao final da sessão foi “O que Almodóvar faria com esse roteiro?”. Foi algo pertinente, pois o rocambole de situações tragicômicas e emoções à flor da pele se encaixariam perfeitamente na filmografia do espanhol. O cinema de Polanski nunca havia me chocado tanto com o riso desde quando o próprio se travestiu em “O Inquilino”, ou quando Peter Coyote ridiculamente imitou um leitão numa sequência de humilhação fetichista em “Lua de Fel”.

O filme começa com um plano contemplativo, sobre o qual são exibidos os créditos iniciais. A imagem nos mostra um parque nova-iorquino... Crianças brincam, barcos passam ao fundo. Não me espantaria se Madonna fizesse uma breve aparição trajando camisa listrada, assoviando “Papa Don’t Preach”, já que o confronto de filosofias em família é o conceito deste filme. Por fim observamos um garoto acertar outro na cara usando um pedaço de pau.

A história então começa! Penelope e Michael Longstreet são os pais de Ethan, o garoto agredido por Zachary, filho de Nancy e Alan Cowan. A família de agressor elabora uma visita à família de agredido para conversarem, entre pais, sobre que medidas tomar em relação aos garotos. O encontro, que a princípio é impossível ser mais polido, transforma-se gradativamente num embate de perspectivas que, num contexto imaginário, idealizei como uma guerra entre os Dursley e os Corleone.

OS LONGSTREET. Penelope é dona de casa dedicada... Prepara receitas gourmet, coleciona catálogos de arte, as tulipas que ornamentam sua sala vieram exclusivamente da Holanda. Dedicada aos estudos sobre a miséria da sociedade africana, acredita piamente na educação humanista e no amor à arte como as chaves para o sucesso pessoal dos filhos. Essa mãe complacente é vivida por Jodie Foster, que emprega à personagem uma fragilidade raramente vista em seus trabalhos anteriores. Michael é John C. Reilly, o eterno Sr. Celofane, em papéis coadjuvantes de maridos oprimidos pela opulência racional das mulheres.

OS COWAN. A Nancy de Kate Winslet é incrivelmente imprevisível e histérica, como uma versão adulta de sua Clementine Kruczynski de “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”. Já o Alan de Christoph Waltz é menos feroz, mais próximo da aura de moleque zombeteiro, ainda que mantenha seu ar nazi-impiedoso de “Bastardos Inglórios” que, particularmente, me espanta. Ambos concordam que o filho merece algum tipo de punição, mas estão longe de simpatizar com os métodos e termos empregados, sobretudo, por Penelope Longstreet.

POLANSKI. Com direção descontraída e certeira, o realizador retorna à glória adormecida desde “O Pianista”. Neste enredo à la “O Anjo Exterminador”, que se passa integralmente na sala dos Longstreet e em que diversas situações impedem que a reunião termine sempre que desejada, culminando na queda das máscaras e bons modos, Polanski exerce sobre as neuróticas personagens e os espectadores um dos aspectos mais fascinantes em sua filmografia: a claustrofobia nervosa, sobretudo nesse cárcere social chamado apartamento.

Nesse quesito, o cineasta acumula grandes sucessos. Desde os primeiros anos de seu trabalho, dedicou-se à exploração dos vícios humanos, observados do ponto de vista mais íntimo. O apartamento é o símbolo máximo dessa carreira, o lar de suas personagens em conflito, de onde se observa o que há de vil lá fora e o que apodrece por dentro... O espelho de uma humanidade acuada, amedrontada, que se perde no próprio medo e nas dúvidas e solidão, deteriorando-se nesse pesadelo construído em forma de lar.

Reflexo lógico da vida de um diretor que passou a existência em fuga, sempre privado da forma mais singela de liberdade. Polanski nasceu em 1933, judeu sobrevivente do holocausto em 1945, teve a mulher gestante brutalmente assassinada em 1969, foi condenado à prisão domiciliar na Europa até pouco tempo, por um suposto abuso sexual. Marcado por perdas e sofrimento, não deixou de se tornar e se manter um profissional brilhante, um grande artista.

Sobre a vida sutilmente encarcerada, produziu tratados profundos em análises psicanalíticas e estéticas. Destaco, sobretudo, “Repulsa ao Sexo”, “O Bebê de Rosemary”, “O Inquilino” e “O Pianista”. Relatos em que o apartamento se transforma na encarnação dos pavores mais íntimos de seus moradores. O mesmo fator torna valioso “Deus da Carnificina”. O espetáculo da degradação humana, mesmo arrancando risos, a ida ao inferno, todos os círculos...

SOMBRAS DA NOITE (2012), de Tim Burton


Burton vive sua fase mais popular no cinema! Temo que realmente tenha se alçado ao mais novo nome do cinema de populacho. Tenho calafrios em pensar que a sequência de “Os Fantasmas Se Divertem” pode se tornar mais um exemplar, perdoem-me a sinceridade, cagado na filmografia recente do exótico Tim... Ou seria a exaustiva repetição de Johnny Depp como protagonista, ininterruptamente desde 2005, a causa de tamanho relapso? Francamente, Burton estacou desde “A Fantástica Fábrica de Chocolate”. A fotografia leitosa, os rostos extremamente brancos. O cineasta nunca perdeu o tato para a direção de arte, a escolha do elenco, a confiança nos acordes de Danny Elfman, o próprio dom da direção. Mas ultimamente parece ter se tornado fantoche dos critérios povão dos produtores e peripécias mal estruturadas por roteiristas contratados. A escolha de Depp também incluída no aspecto povo... “Piratas do Caribe” o lançou aos papéis mais bizarros de sua carreira. O que não considero interessante, já que todos acabam por parecer a mesma entidade devido à proximidade dos trabalhos e semelhante grau de excentricidade nas personagens. A voz, os trejeitos... Em Burton especialmente, já que o diretor amou a fotografia digital e não passa mais um filme sem fazer com que os atores pareçam ter recebido um banho de leite, sobretudo Depp. O ator caiu no gosto popular com “Piratas”. Seu nome chama mais atenção do que qualquer outra coisa. Atrai principalmente adolescentes, ou aquele espectador sem idade específica que se satisfaz apenas em ver um Depp afetado e piadista em situações que parecem citar “Chapolin”.

“Sombras da Noite” foi, a princípio, uma surpresa. Eu esperava muito menos e quase desisti de assistir na última hora. Seria um ótimo filme se não tivesse me dado três incômodos, sendo que dois se situam justamente no clímax e foram capazes de murchar tudo que eu já havia adorado na projeção.

É a história da família Collins de Collinsport, desgraçados por uma maldição. Família de viúvos e filhos com hábitos estranhos, como conversar com os mortos. O feitiço em questão abre o filme e nos apresenta o protagonista, Barnabas Collins ‘Depp’, que ao partir o coração de uma bruxa é transformado em vampiro e enterrado nos arredores de seu povoado no século XVIII. Quase duzentos anos depois, a jovem Victoria Winters segue jornada à Collinsport para se tornar a nova tutora de David Collins, o mais jovem da família. A década é 1970 e nesse quesito o filme é impecável! A trilha é deliciosa, bem como as representações da época nas atitudes, figurino, palavreado... Helena Bonham Carter está no melhor estilo Joana Fomm em “Dancin’ Days”. Formidável!

Nesse cenário disco, o imortal Barnabas é acidentalmente desenterrado. Retornando à sua mansão, abre o jogo sobre sua condição com Elizabeth Collins, a atual chefe da família vivida pela eterna felina Michelle Pfeiffer. Instalado por ela como um primo chegado da Inglaterra, Barnabas usa de sua fortuna intocada em um cofre secreto para reestruturar os negócios da família. Paralelamente utiliza seus dons sobrenaturais para influenciar os cidadãos de Collinsport e vingar-se da também imortal Angelique, a bruxa que o amaldiçoou.

O filme caminha muitíssimo bem... Boa dose de suspense, humor, tensão, rock, folk e composições épicas. Barnabas é uma bela peça na filmografia de Burton, carregado de caligarismo. Me encantei com seu modo de posicionar as mãos enquanto dorme, ou quando dorme de cabeça para baixo... Um morcegão, de fato.

Agora os incômodos. Primeiro a cena de sexo entre Barnabas e Angelique... Muito do que se passou depois me fez aliviar a gastrite iniciada nessa sequência. Se fosse a única coisa avacalhada, eu aplaudiria no final. A cena abusa dos movimentos rápidos de câmera, para demonstrar a intensidade do ato sem burlar a classificação indicativa. Pretendeu ser cômico, mas não dei uma risada. Muitos riram, mas eu não. Mesmo! Achei palhaçada, cúmulo do exagero, apelo desnecessário àquela altura do filme, como se tivesse obrigação de fazer com que as crianças se distraíssem com essa situação tola, no lugar de realmente fazer algo sensual e marcante. Não precisava ser explícito, mas que tivesse o charme à altura de Eva Green. Poderia ser a nova lambida da Mulher-Gato se não tivesse se tornado um pastelão de doer os olhos e ouvidos.

Segundo incômodo. Não darei nenhum detalhe, pois se trata precisamente do clímax, a sequência final em que tudo se decide! Novamente, poderia ter sido mais simples e marcante. O que aconteceu foi um carnaval de eventos, pautados por um turbilhão de efeitos especiais. Senti como se aquilo fosse feito pela obrigação de ter efeitos especialíssimos no filme, como se fizessem muita diferença. Não era preciso tanto. Ação corporal e um diálogo triunfante bastariam... Mas não. Muitos corpos e coisas voando, objetos ganhando vida, um fantasma que não precisava ter aparecido só pra ser mais um efeito. Isso sem falar na personagem que revela, desnecessariamente nesse último momento, que é um lobisomem. Além de parecer mais uma desculpa para entreter criança e usar de tecnologia, a performance não foi convincente. A pessoa em questão estava tão bem na personagem durante todo o filme, mas naquele momento parecia estar encenando uma peça escolar. Vergonhoso...

Por fim, no lugar de terminar o filme com uma última imagem bem composta, acompanhada de uma fala que amarra princípio e fim, o diretor chutou o balde e colocou mais uma sequência que poderia até vir depois dos créditos finais. E eu disse “poderia”. A informação nessa ceninha é extremamente óbvia para quem se atentou aos menores, e este nem foi tão discreto, detalhes do filme. Pareceu artimanha de produtor, como se quisesse aguçar a expectativa de uma continuação. A cena é rápida, mas aniquila a recepção da sequência anterior, que é bonita, dramática, realmente o final do filme, o final da história.

Como não vejo sentido em dar nota, estrelinhas, para produtos de arte, simplesmente digo que me decepcionei. Se fosse juntar tudo que me incomodou, deve durar menos de 20 minutos. O filme tem 113 minutos, mas mesmo assim, nas circunstâncias dos erros, não posso considerar como um trabalho digno de Tim Burton. Pareceram coisas exigidas para chamar atenção. Uma criança ou o espectador comum podem ficar alvoroçados com isso, algo que chama atenção pelo excesso, porém um mau excesso, um desfile de artifícios pobres. Se o filme fosse montado de novo sem esses exageros gráficos e participações pífias no clímax, eu iria amar. Espero que Burton se atente daqui em diante e volte a ser o verdadeiro criativo por trás de tudo em seus trabalhos. Que se lembre da premissa de tocar seu público com os sentimentos e não apelar tanto para as modinhas de Hollywood.